trazendo análises novas sobre dados antes não
computados, que ampliaram consideravelmente o entendimento do fenômeno. Em
essência, os resultados do novo documento aumentaram o nível de certeza sobre a
origem humana do problema, confirmaram as tendências climáticas assinaladas nos
relatórios anteriores e a gravidade das perspectivas futuras, e alertaram que
os riscos da inação se tornam a cada dia maiores.[118][119][120][121] No
prefácio da publicação, o secretário-geral da OMM e o diretor-executivo do
PNUMA fizeram uma declaração conjunta, dizendo:
"O relatório confirma que o aquecimento do
sistema climático é inequívoco, e muitas das mudanças observadas não têm
precedentes no intervalo entre as últimas décadas e milênios atrás: o
aquecimento da atmosfera e do oceano, a redução da neve e do gelo, a elevação
do nível do mar e a crescente concentração de gases estufa. Cada uma das
últimas três décadas foi mais quente que qualquer outra década desde 1850.
[...] A mudança climática é um desafio de longa duração, que requer ação
urgente devido à velocidade e escala com que os gases estufa estão se
acumulando na atmosfera, e devido aos riscos envolvidos em uma elevação de
temperatura superior a 2 ºC. Hoje precisamos estar focados no essencial e na
ação, senão os riscos se tornarão maiores a cada ano".[122]
Para Suzana Kahn Ribeiro, que fez parte do grupo de
pesquisadores brasileiros que colaboram com o IPCC, "o grande ganho (do
novo relatório) é a comprovação do que tem sido dito há mais tempo, com muito
mais informação sobre o papel dos oceanos, das nuvens e aerossóis".[123]
Mercedes Bustamante, uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho III, sobre a
mitigação, aponta que também houve mudanças importantes em relação ao relatório
anterior no sentido de unir o estudo do uso da terra e das florestas com o da
agricultura, em vista da maior atenção que vem sendo dada à relação entre
conservação da natureza e segurança alimentar.[124]
Consequências
Clima
Projeção das mudanças no regime anual de chuvas até
o fim do século XXI. As zonas mais azuis devem receber mais chuvas, e as mais
alaranjadas devem experimentar a maior redução. O mapa mostra que praticamente
toda a área de produção agropecuária do Brasil, e grandes biomas úmidos que
dependem vitalmente de água e chuva abundantes, como o Pantanal e a Mata
Atlântica, estão sob ameaça de tornarem significativamente mais secos. Outros
que naturalmente têm menos precipitação, como o Cerrado e a Caatinga, também
devem ter seu equilíbrio afetado negativamente. A Caatinga, que é naturalmente
a região mais seca do Brasil, poderá receber até 50% menos de chuvas nas
projeções mais pessimistas (6 °C de aquecimento). O Pampa, por outro lado,
poderá ter sua precipitação aumentada em até 40%. Em ambos os casos, as
mudanças que isso provocará no equilíbrio dos biomas provavelmente serão
significativas.[125] Vários estudos preveem a savanização de grandes áreas da
Floresta Amazônica e a desertificação de outros ecossistemas brasileiros, com
extensa perda de biodiversidade e impacto
socioeconômico.[126][127][128][129][130][131][132] Portugal todo deve ficar sob
influência semelhante.
O aquecimento da atmosfera aumenta sua capacidade de
reter vapor d'água, bem como aumenta a evaporação das águas superficiais
(oceanos, lagos e rios). Isso tem dois efeitos importantes: em primeiro lugar,
aumenta a quantidade de água disponível na atmosfera, e em certas regiões,
quando essa água em vapor se converte em chuva, tende a chover com mais
intensidade porque há mais água a descarregar. Prevê-se que essa precipitação
aumentada tenha uma distribuição irregular nas diferentes regiões do mundo,
enquanto outras zonas devem experimentar uma redução nas chuvas. Esta
irregularidade é resultado da combinação de vários outros fatores influenciados
pelo aquecimento, como a mudança no regime de ventos, nas correntes oceânicas e
na linha de monções. Uma série de eventos extremos recentes associados ao ciclo
das águas, como chuvas torrenciais, secas recorde e ciclones tropicais
devastadores com pesada precipitação, vem sendo relacionada ao progressivo
aquecimento global. O segundo efeito deriva do fato de que o vapor d'água é um
gás estufa por si mesmo, e de todos o mais importante, porque existe em grande
quantidade na nossa atmosfera naturalmente. Com o aumento do calor, o
aquecimento global se intensifica por um ciclo de auto-reforço: aumenta a
evaporação, mais vapor d'água vai para a atmosfera e o efeito estufa se acentua;
então o calor aumenta ainda mais, aumenta a evaporação e assim
sucessivamente.[13][83][118][30][133][134]
Em função do desequilíbrio hídrico, em algumas
regiões subtropicais está prevista tendência à desertificação, perdendo-se
áreas férteis necessárias às lavouras e diminuindo a superfície coberta por
florestas, de onde o homem obtém madeira e vários outros produtos naturais
valiosos, e que são responsáveis por boa parte da produção de oxigênio e da
redução dos níveis de gás carbônico. Com a diminuição da capacidade da natureza
de reciclar o gás carbônico, o efeito estufa se realimenta. Ao mesmo tempo a
redução nas florestas provoca regionalmente o declínio dos mananciais de água e
das chuvas, criando outro ciclo de auto-reforço para aumento dos danos ambientais.[135][136][83][137][138]
Espera-se que as alterações nas temperaturas, no ciclo da água e no clima em
geral afetem negativamente de múltiplas maneiras a biodiversidade, a
agricultura, a pecuária, a silvicultura e a produção de alimentos.[135][136]
O ciclone Nargis. O aumento da ocorrência ou
intensidade de fenômenos de clima extremo como esses é uma consequência
provável do aquecimento global
Também estão previstas mudanças no padrão dos ventos
e o aumento na frequência e intensidade das tempestades severas e das ondas de
calor extremo. Mesmo os eventos climáticos normais devem sofrer alguma
intensificação, pois todo o sistema do clima está mais quente e úmido. Desde a
década de 1950 a maior parte do mundo tem experimentado ondas de calor mais frequentes
e intensas, e as ondas de frio também podem se agravar sob certas
condições.[13] A intensidade dos furacões ou ciclones tropicais depende numa
relação estreita da quantidade de umidade na atmosfera e do nível de calor na
atmosfera e na água do mar sobre a qual se formam.[13][133] Os ciclones
tropicais são a catástrofe natural que mais causa prejuízos materiais nos
países desenvolvidos, e nos países em desenvolvimento são uma das maiores
causas de fatalidades e ferimentos decorrentes de catástrofes naturais.[139]
Serve de exemplo o ciclone Nargis, que afligiu a Birmânia em 2008: pelo menos
85 mil pessoas morreram, um ano depois cerca 54 mil ainda eram dadas como
desaparecidas (o número exato é controverso e pode ser muito maior; as Nações
Unidas estimaram em mais de 300 mil entre mortos e desaparecidos), 1,5 milhão
foram evacuadas, e um total de 3,2 milhões foram afetadas de diversas maneiras
em torno do delta do rio Irauádi, a região mais atingida, e onde se localiza
Yangon, a principal cidade do país. Cerca de 700 mil moradias foram destruídas,
3/4 das criações de animais pereceram, metade da frota pesqueira afundou, um
milhão de acres de terras cultivadas foram salgadas por uma maré de tempestade
de 3,5 metros que acompanhou o ciclone, os mananciais de água doce foram
salgados e contaminados, e os sobreviventes sofreram com epidemias de febre
tifoide, cólera, disenteria e outras doenças, além de fome, sede e falta de
assistência médica e abrigo.[140][141] A recuperação das nações pobres
atingidas por desastres tão graves às vezes leva anos, só para em pouco tempo
serem sujeitas a novos desastres, muitas delas estando localizadas em áreas
naturalmente propensas a eles, como no sudeste asiático e no Caribe. Com o
crescimento constante da população do mundo e sua progressiva concentração nas
cidades, que frequentemente não conseguem se adaptar a tempo para acompanhar o
inchaço populacional e se tornam por isso particularmente vulneráveis, os
impactos tendem a ser maiores pela maior exposição da população somada à maior
intensidade dos fenômenos destrutivos.[141][142]
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